Dorme, meu amor,
que o mundo já viu morrer mais este dia
e eu estou aqui, de guarda aos pesadelos.
Fecha os olhos agora e sossega
o pior já passou há muito tempo;
e o vento amaciou;
e a minha mão desvia os passos do medo.
Dorme, meu amor
a morte está deitada sob o lençol da terra onde nasceste
e pode levantar-se como um pássaro assim que adormeceres.
Mas nada temas:
as suas asas de sombra não hão-de derrubar-me
eu já morri muitas vezes
e é ainda da vida que tenho mais medo.
Fecha os olhos agora e sossega
a porta está trancada;
e os fantasmas
da casa que o jardim devorou
andam perdidos nas brumas que lancei ao caminho.
Por isso, dorme, meu amor,
larga a tristeza à porta do meu corpo e nada temas:
eu já ouvi o silêncio, já vi a escuridão,
já olhei a morte debruçada nos espelhos
e estou aqui, de guarda aos pesadelos
a noite é um poema que conheço de cor
e vou cantar-to até adormeceres.
Maria do Rosário Pedreira